segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Sobre sair da bolha e o medo da morte



Desde o início dos tempos, a questão da morte e da finitude, muitas vezes acaba por alterar a tranqüilidade e o prazer de existir freqüentemente sendo substituídos por fluxos de pavor e mesmo de desorganização psíquica.

Existe um medo inerente ao ser humano que é o medo em relação ao que alguns costumam chamar de "passagem".

As perguntas que ficam em relação ao tema, permeiam questões sobre o desconhecido, sobre a própria finitude, sobre a razão da vida, sobre o que é transcendente.

Ao longo de nossas vidas, inúmeras são as vezes na qual vivenciamos ciclos emocionais repetitivos. Isso se deve ao fato de que "lá", quando ainda éramos crianças e com os recursos e conhecimentos que pode ter uma criança, entendemos que nos manifestarmos com determinados padrões de comportamentos na certa seria o seria o melhor para sobrevivermos a situações conflitantes.

Ocorre que com o desenvolvimento que vem através da linha do tempo e com as novas oportunidades que a vida oferece, pode-se gradativamente entender que o que a nossa criança entendeu "naquele tempo" pode ser totalmente redimensionado, abrindo espaço para novos entendimentos sobre nós mesmos bem como sobre as nossas relações para com a vida. Infelizmente, porém, não é sempre que este tipo de transformação saudável acontece.

Infinitas são as vezes onde pessoas caminham rumo a novas experiências, porém ainda fixadas em referências antigas que de nada servem para as dinâmicas da atualidade individual. Talvez por questões traumáticas, por medo excessivo ou pelo grau de fixação de prazer distorcido daquela resposta vinda da infância, é possível se perpetuar indefinidamente numa situação de realidade onde já não exista nenhuma validade para a consciência atual. Neste sentido, existe uma emergência silenciosa de se sair desta espécie de bolha. Porque se ao se perpetuar neste ciclo vicioso, deixa-se de viver aspectos fundamentais da vida. Toda a energia fica represada de modo circular gerando um tipo de hipnotismo que literalmente impede o mergulho numa realidade mais profunda do existir.

Por vezes, num engano atroz e por medo do desconhecido que representa sair da "bolha" e de se atirar no mundo da realidade, pessoas e mais pessoas acabam por se perpetuar nas mesmas questões emocionais, vagueando como sonâmbulas, mudando os cenários vivenciais, mas não as questões emocionais envolvidas. Nada se recicla, portanto, é nesta situação que a vida não acontece.

O medo de morrer, neste sentido, ocorre quando a pessoa sente que ficou em dívida com a vida, ao se lidar com o mundo da realidade, com as alegrias e com as frustrações inerentes a todo aquele que efetivamente está vivo. Quem deixa de vivenciar aspectos fundamentais de sua própria vida, pode ter um medo da morte cristalizado extremamente difícil de ser superado. É uma situação emocional e de alma bastante complexa para ser remodelada. Isso costuma ocorrer principalmente quando o indivíduo tem consciência de que está em dívida consigo mesmo, ou seja, sente que a própria vida não foi suficientemente vivida.
É freqüente a pessoa saber que tem uma conta a pagar a si mesma e, quer seja pela falta de coragem ou pela falta de iniciativa, sente que não aconteceu a renovação do que já estaria morto.

A grande questão é a de sair da bolha conhecida que se manteve permeada em meio a um montante de investimento de ilusões, sonhos de realização, idealizações e medos Nesta situação, para que efetivamente uma ruptura e, por conseqüência, uma transformação de vida ocorra, o ego deve estar suficientemente fortalecido para que possa comandar toda essa mudança paradigmática.

Observem que a questão da morte, da finitude, é um assunto que sempre interessa. Desde um rompimento afetivo, a perda de um animal de estimação, a perda de pessoas próximas e mesmo no vislumbre da nossa própria morte. É lógico que o processo de desligamento é muitas vezes complicado. Existem inúmeras questões envolvidas. Aqui, falo da plenitude da vida para que possamos de algum modo alcançar a finitude que nos espera na condição de humanos que somos de maneira mais autoconsciente e lúcida.

- Sabendo que as nossas existências estão válidas.

Agora voltando ao caso da suposta "bolha", imagine um ator que não queira abandonar um papel no qual esteja atuando e o personagem acaba assumindo o controle sobre o ator (consciência encarnada), para esse personagem seria a morte. Penso que romper a "bolha" faz parte do caminho da nossa iluminação. Esse tipo de passagem nem sempre é simples ou fácil a princípio... Depois que se toma consciência da dimensão do drama/bolha em que se está inserido é que efetivamente começa-se a sair dele. É quando nos tornamos incorruptíveis num caminho de volta, pelo fato da autoconsciência adquirida. Na seqüência, encaminha-se para perceber que essas mesmas dimensões/bolhas se tornarão apenas imagens, depois memórias distantes e, logo após, alcança-se o status de se ficar totalmente desidentificada com o antigo lugar. É neste momento que a vida começa por ficar totalmente dinamizada de outro modo.

Nesse palco terreno, todos somos protagonistas, elegemos os antagonistas com os quais lutaremos e, nessa luta épica individual, almejamos sair vitoriosos e por vezes a vitória é apenas abandonar um ciclo que se repete e que não leva a lugar nenhum.

Penso que a vida deveria ser encarada mais esportivamente, onde aprendemos a dar valor tanto as derrotas quanto as vitórias.

Esse tema sobre vidas não vividas também é muito oportuno, por que vejo isso o tempo todo em muitas pessoas, essa cobrança sobre sonhos e projetos não realizados é muito comum. Também vejo pessoas que para fugir dessa frustração dizem viver só o momento presente, abrem mão de projetos e sonhos para não ter que enfrentar possíveis derrotas.

A filosofia deveria ser: "Deixa a vida me levar, mas que eu tenha o leme em minhas mãos". Ou ainda, "viver todo mundo vive, mas existir é para poucos".

Agradecimentos: Este texto surgiu de um bate-papo de Silvia Malamud com Edson de Oliveira.

Silvia Malamud é colaboradora do Site desde 2000.

Psicóloga e atua em seu consultório em São Paulo.

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Autora do Livro: Projeto Secreto Universos

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